quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Mitologia dos Orixás: Xangô, Odus e a Justiça


Antes, recomendo a leitura do texto Mitologia dos Orixás para que possamos entender o porquê dos mitos. Vale a pena.


Um mito yorubá traz um pouco dessa noção de justiça divina atribuída ao nosso Pai Xangô:

Durante o início dos tempos haviam 16 Odus, um deles Xangô, o odu Obará Meji. Xangô era o mais pobre dos odus, e estes com vergonha de Xangô foram visitar Deus e não convidaram Xangô. Chegando lá Deus deu a eles uma tarefa, preparar um ebó. Mas sendo ricos não sabiam cozinhar, e então nada fizeram. Xangô, ficou sabendo da visita, e descobriu a receita e logo que pode realizou o Ebó. Passado algum tempo os outros 15 odus voltaram a encontrar Deus, e Deus deu a cada um uma abóbora. Por respeito nada disseram, mas todos acharam aquilo algo por demais simples. Ao saírem perceberam que estavam com fome, muita fome, e então decidiram ir até Xangô e pedir a ele comida. Xangô os felicitou e entregou aos seus irmãos toda a sua comida, cozinhou e alimentou os irmãos. Que depois de satisfeitos foram embora, e deixaram suas abóboras para Xangô. Xangô começou a ficar com fome, mas não tinha o que comer, dera tudo a seus irmãos. Então pegou uma das abóboras cortou para comer quando então percebeu que estava recheada de pedras preciosas e jóias. Xangô abriu todas as 15 abóboras e em todas havia um tesouro. Xangô agora era mais rico dos que os 15 odus juntos. Ao perceberem isso os 15 odus foram pedir justiça a Deus, que então falou: me pedem justiça? Pois saibam que a justiça foi feita!

Este mito nos traz a idéia de que Justiça Divina, atribuída ao nosso Orixá Xangô, é a de entregar o verdadeiro tesouro, ou seja o tesouro de Deus, nas mãos daqueles que não medem esforços para amar e alimentar seus irmãos.


No mito Xangô não pensou em si ao dar o alimento aos seus irmãos, apenas viu que estavam com fome, que estavam necessitados. Pegou tudo que tinha e saciou aqueles irmãos. Mesmo depois de ter sido negado por esses mesmos odus, ter sofrido preconceito, ter sido deixado de lado. Xangô não julgou, apenas socorreu àqueles que a sua porta chegaram, sem nada pensar em troca, sem nada guardar rancor. Então Deus garantiu que Justiça fosse feita, e que Xangô recebesse pela sua benesse, pelo seu desprendimento. Garantiu um tesouro divino a Xangô.


Deus dá a nós na medida em que entregamos aos outros, pois quem socorre um filho de Deus, com certeza será socorrido pelo próprio Deus. E nada mais justo que encher de luz aqueles que fazem a vontade do Pai. Salve Xangô a manifestação da justiça divina em todos nós.


Kaô Kabecilê.



Pai Caetano de Oxossi

PS. O mito foi baseado no descrito por Reginaldo Prandi no livro “Mitologia dos Orixás”, editora Companhia das Letras.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

O Pai (Mãe) de cabeça - os caboclos da Umbanda


Na raiz de Umbanda a qual pertenço apenas um caboclo pode assumir a cabeça de um filho. Ou seja, o representante do Orixá Ancestral na coroa de uma pessoa será sempre um caboclo.


Entender esta afirmação é entender que para nós um preto-velho, uma criança não assumem a cabeça de um filho. Para nós os Pretos-velhos são os grandes administradores da Umbanda, gerenciam os trabalhos, cuidam da integração, do andamento das energias. Já as crianças são as responsáveis pela ativação, busca e controle das energias elementais, dos espíritos elementares para a magia dos terreiros.


O fato de não assumirem a cabeça de um filho não os deixa menores ou menos importantes, mas demonstram como na Umbanda há uma harmonia e uma divisão das tarefas, aliás, esta harmonia é presidida e zelada pelos Pretos-velhos.


Os caboclos representam a força dos Orixás na Terra, trazem a vontade dos Orixás para nós, e, portanto, são os representantes dos Orixás nos terreiros e nas coroas. Assim, em nossas casas sempre terá a chefia da gira e do terreiro um caboclo ou uma cabocla.


O chefe do terreiro será sempre o representante do Orixá na cabeça do Pai de Santo ou Mãe de Santo, é o que chamamos de pai de cabeça ou mãe de cabeça. Assim se o Pai de Santo é filho de Oxóssi (o pai de santo fundador da casa) a entidade chefe será um representante de Oxóssi. Se o terreiro é de Ogum, a entidade chefe da gira e do terreiro será um caboclo ou uma cabocla de Ogum, o mesmo ocorrendo com Oxóssi, Yemanjá, Iansã, Oxalá, Xangô e Oxum. Os assentamentos são seguidos segundo o Orixá sob a decisão final da entidade chefe do terreiro, portanto de um caboclo ou de uma cabocla.


Costumo dizer que o terreiro é do Pai Tobias de Guiné, e a chefia do terreiro é do caboclo Mata Virgem. Ou seja, há uma interação estreita entre estas entidades que chefiam a nossa casa, mas a gira é de Oxóssi, e, portanto a chefia cabe a um caboclo de Oxóssi, no caso nosso seu Mata Virgem.


Qual a razão dos caboclos terem esta atribuição? Fiz este questionamento aos nossos guias e a resposta foi a seguinte:


“Os donos da terra sempre serão os representantes dos Orixás naquela terra, se a Umbanda fosse da África os representantes dos Orixás na cabeça dos filhos seriam os pretos-velhos. Aliás,nos cultos do povo Bantu é exatamente isso que acontece, os representantes dos Nkices são ancestrais daquele povo, nos nagôs os Orixás são, representativamente, grandes reis ou rainhas. No Brasil os donos são os indígenas, assim a terra daqui precisa desses ancestrais para manifestar a força dos Orixás nas cabeças de vocês.” Pai Tobias de Guiné

Aliás, iniciamos nossa gira com uma cantiga que fala "...gira, gira dos caboclos, sem sua gira eu não posso trabalhar, assim, assim na fé de Oxóssi meu Pai, sem sua gira eu não posso trabalhar." Uma demonstração clara de que para nós Oxóssi enviou um caboclo para ser seu representante na Terra e chefiar nossa Gira.


Em nenhum momento há a prevalência, repito, de uma entidade sobre a outra, de uma forma de apresentação sobre a outra. O que nós apresentamos é apenas uma forma de distribuição de funções seguindo um entendimento de nossa raiz, avaliado e confirmado pelas entidades que nos orientam e chefiam nossa casa. A Umbanda, assim, mais uma vez dá a demonstração de sua ligação íntima com a natureza, com a ancestralidade, mostrando sua riqueza e a profundidade de seus fundamentos e elementos.


Talvez muitas coisas ainda não possamos entender, mas com o passar do tempo muitas se revelarão, e tenho a certeza que cada passo nesta direção fortalecerá nossa crença, nossa fé e consolidará a Umbanda em espaços cada vez mais amplos.


Autor: Pai Caetano de Oxossi

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